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Arquitetura indígena inspirou a construção do moderno Centro Sebrae de Sustentabilidade

Conheça a história por trás da obra que une técnicas ancestrais à modernidade que ressalta a relevância do conhecimento indígena
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Os povos indígenas do Brasil têm lutado incansavelmente pela preservação de suas culturas, territórios e direitos, no qual têm como símbolo o Dia Nacional da Luta dos Povos Indígenas, movimento em prol do reconhecimento e celebração da rica herança dos povos originários. Neste contexto, emerge o Centro Sebrae de Sustentabilidade (CSS), um marco arquitetônico que presta homenagem à sabedoria ancestral Yawalapiti, povo indígena do Xingu, em Mato Grosso.

O prédio anexo à sede do Sebrae/MT, em Cuiabá, construído em formato ogival (forma determinada por dois arcos), é um tributo e testemunho da conexão entre tradição e modernidade desenhado pelo arquiteto José Afonso Botura Portocarrero, que é professor da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) e doutor em habitações indígenas brasileiras.

O fascínio pelos elementos arquitetônicos indígenas resultou em construções modernas e inovadoras, como o próprio CSS e o Memorial Rondon, localizado no distrito de Mimoso, em Poconé.

Ao adotar o desenho das casas indígenas como inspiração, o CSS recebeu uma cobertura em duas camadas, fazendo uma alusão às coberturas de palha das habitações indígenas. Essas camadas permitem a circulação do ar entre as cascas o que proporciona à casa uma sensação de respiração, frescor e uma conexão harmoniosa com o ambiente ao seu redor.

Portocarrero defende as técnicas de construção indígena como uma referência tradicional e ancestral da habitação brasileira que por muito tempo permaneceu subestimada, relegada a um segundo plano. Ele busca constantemente a valorização e o resgate cultural em suas obras.

“O desenho das casas indígenas não pode ser considerado como uma coisa que já passou, que não interessa, ele interessa e é muito importante que a gente olhe as coisas que já foram feitas, para as construções mais antigas, e aprender com elas. Respeitá-las, ver o seu valor e aprender com elas. Exatamente neste momento em que a gente fala tanto de tecnologia, de avanço, de inovação, muitas vezes há um excesso de uso dessa tecnologia, que é cara também, que custa energia, enquanto as moradias ancestrais utilizavam apenas energia natural. O vento, a insolação, enfim, é esse desenho da casa indígena traz para a gente neste mundo contemporâneo”, exemplifica Portocarrero.

O resgate do desenho das casas indígenas não apenas honra o passado, mas oferece lições valiosas para o presente, como o contato com a natureza e conservação do meio ambiente, valores fundamentais na cultura indígena. Uma das características é como o espaço não possui paredes divisórias internas, tal como as casas originárias que tem o intuito de manter todos os presentes juntos seja para uma roda de conversa ou para as atividades diárias.

O processo de construção também incluiu o reaproveitamento de resíduos, como madeiras e pedras. Além disso, a obra foi adaptada ao terreno em declive, evitando a terraplanagem e preservando a vegetação nativa. Outra característica das casas indígenas é o lavabo que foi projetado para a área externa do prédio principal, mantendo assim a cultura ancestral.

Valorização cultural

As maquetes do projeto do Centro Sebrae de Sustentabilidade estão expostas dentro do prédio. Foto: Divulgação

Toda história do Centro Sebrae de Sustentabilidade serve como um exemplo inspirador de como a valorização das culturas indígenas pode ser integrada ao desenvolvimento sustentável e à inovação.

Durante a construção, Jucimar Ipaikire, do povo Baikairi, um dos primeiros indígenas mato-grossenses a se formar arquiteto, fez parte dos esboços de maquetes do CSS. A influência da mãe artista, que pintava tecidos, objetos e corpos na aldeia, junto do trabalho de construtor de casas tradicionais do pai, o motivou a cursar arquitetura.

Na profissão, ele trabalhou em construções de poços artesianos e levou infraestrutura para diversas aldeias, incluindo Enawene, Bakairi, Bororo, Umutina, Nambiquara, Pareci, Chiquitano, Manoki, Miki e Guató.

Atualmente, Jucimar reside na aldeia Pakuera, do povo Bakairi, para a qual retornou durante a pandemia, visando à segurança da família. Nesse período, ele tem se dedicado a projetos voltados às aldeias, sem cobrar pelo serviço.

Ao longo da história do Brasil, os povos indígenas têm enfrentado desafios e resistido à marginalização, sempre lutando pela manutenção de suas tradições e territórios. Entre os desafios, o Baikairi aponta que um deles é enfrentar o avanço do agronegócio, que invade o território indígena e impacta as atividades agrícolas.

“A terra é pequena para as nossas necessidades, e o avanço das fazendas prejudica nossas atividades tradicionais. Além disso, enfrentamos o impacto da tecnologia em nossas comunidades, principalmente com a presença das redes sociais, que podem ser usadas tanto para preservar nossa cultura quanto para nos influenciar negativamente”, afirma Jucimar.

No contexto do Dia Nacional da Luta dos Povos Indígenas, celebrado em 7 de fevereiro, o Centro Sebrae de Sustentabilidade surge como um exemplo vivo de reconhecimento e valorização desse povo.

Para Jucimar destacar e compartilhar as perspectivas sobre a importância do respeito à cultura e à terra, bem como os desafios enfrentados em meio à luta pela preservação de suas tradições é uma forma de promover a ancestralidade e conectar a sociedade às raízes culturais e aos conhecimentos tradicionais.

“Acredito que a cultura é transformação; precisamos evoluir sem esquecer nossa ancestralidade. O Centro Sebrae de Sustentabilidade é um exemplo disso, mostrando a junção entre o tradicional e o tecnológico, algo que aprendi ao conversar com o professor José Afonso durante a construção do CSS. Essa experiência me mostrou como a arquitetura pode se adaptar às necessidades tradicionais, utilizando tecnologias modernas sem perder nossa identidade cultural”, completa.

Práticas sustentáveis

O Centro Sebrae de Sustentabilidade, além de ser uma estrutura física símbolo de integração, respeito e reconhecimento, reúne em suas dependências conteúdos informativos sobre práticas sustentáveis e é aberto à visitação. Para mais informações e agendamento acesse o site sustentabilidade.sebrae.com.br ou entre em contato pelo telefone (65) 3648-5276 / 0800 570 0800.

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