As comunidades periféricas espalhadas pelo país convivem diariamente com uma realidade contraditória. Por um lado, são espaços marcados pela ausência de políticas públicas e, por outro, representam um mercado expressivo que movimenta R$ 330 bilhões por ano (considerando as 12 mil favelas existentes em todo o Brasil). Essa contradição também está presente na enorme informalidade que domina o empreendedorismo nesses espaços. Segundo pesquisa do DataFavela, 70% dos donos de negócios nas favelas não têm CNPJ.
O potencial de consumo e de empreendedorismo das comunidades periféricas, entretanto, vem, há tempos, sendo percebido por diversas empresas e bancos públicos, que desenvolvem soluções específicas para esse imenso segmento da população brasileira. Isso confirma o fato de que baixo poder aquisitivo não implica, necessariamente, pouco poder de compra.

Atento a esse cenário, o Sebrae tem atuado para aproximar o desenvolvimento social do desenvolvimento econômico, por meio da atuação concreta nesses territórios. “Queremos incentivar os assistidos pelos Centros de Referência de Assistência Social (CRAS) a frequentar nossos cursos nas salas do empreendedor”, enfatizou a gestora de inclusão socioprodutiva do Sebrae Nacional, Helena Rego, na abertura da ExpoFavela Innovation Brasil 2025, que ocorreu em São Paulo (SP) nos últimos sábado (29) e domingo (30).
Promovido pela Favela Holding, em parceria com a Cufa – Central Única das Favelas, o evento tem como foco a valorização e o estímulo ao empreendedorismo nas comunidades – consideradas locais de potência, criatividade, força e inovação – para gerar impacto econômico e social.
“A decisão de formalizar a fonte de renda vem com o tempo, com a sustentabilidade do negócio. E só traz benefícios, pois permite a emissão de nota fiscal, a inserção no sistema previdenciário e a conexão com políticas públicas de incentivo à contratação de serviços de MEIs (microempreendedores individuais)”
Helena Rego, gestora de inclusão socioprodutiva do Sebrae Nacional
Expansão de mercado
A ceramista Mazé Carvalho é uma prova de que, uma vez estruturados, os pequenos negócios conseguem abrir novos mercados. Há 20 anos fabricando tijolos manuais na residência da família, na periferia de Teresina (PI), a empreendedora decidiu passar a produzir uma linha de itens para casa, com xícaras, pratos decorativos, ímãs de geladeira, filtros de barro e “copinhos de dose” para licor, cachaça ou café, tudo pintado à mão, com preços de R$ 10 a R$ 125.

Cadastrada no Sicab (Sistema de Informações Cadastrais do Artesanato Brasileiro), ela promove seus produtos participando de feiras, onde foca nos objetos menores, “pela facilidade do cliente transportar”, além das vendas diretas online. “O Sebrae me ajudou na precificação e a montar meu perfil no Instagram”, conta Mazé, que concluiu recentemente o segundo ano de mentoria mensal dentro do programa Tramas Piauienses, de fomento ao artesanato.
Para Suzany Araújo, diretora criativa da confecção agênero Oyewá, de Goiânia (GO), a mentoria do Sebrae também ajudou na precificação das peças exclusivas confeccionadas em tecidos naturais, sem tingimento, que ela apresenta em um pequeno estande na ExpoFavela. “Para empreender no mercado da moda, tem que ser muito resiliente. A competição com grandes redes é difícil, mas acho que os produtores de moda menores conseguem descolonizar o mercado”, diz.

Tendo como apelo a sustentabilidade de roupas atemporais e sem gênero, ela participou do concurso de estilistas promovido pelo Sebrae durante a Amarê Fashion – Semana da Moda Goiana. “Foi uma experiência importante para a projeção e a visibilidade do negócio e para a preparação da coleção”, relata.
Em outro segmento, A Gloriosa Pimenta, fábrica oriunda da comunidade periférica de Osasco, na Grande São Paulo, faz sucesso com seus molhos, geleias e pimentas com misturas inusitadas, como goiaba e cachaça, gengibre e suco de maçã. Pelo terceiro ano consecutivo na ExpoFavela, a sócia Camile Rodrigues comprovava que, quando o produto é bom e diferenciado, há demanda em todas as classes de consumo.
“Minha maior renda vem da participação nesse tipo de evento”, dizia a psicóloga de formação que começou a fazer molhos de pimenta para os amigos até que veio a pandemia. “Fiz vários cursos do Sebrae e hoje participo do ALI Rural (Programa Agentes Locais de Inovação). Conto com a orientação de uma engenheira de alimentos, que nos auxilia no aperfeiçoamento e incremento da produção.”
Casa da Potência

Para incentivar os visitantes da ExpoFavela a gerar renda própria, o Sebrae Nacional montou um estande com diversas ativações, intitulado ‘Casa da Potência’. Uma oficina de lenços ensinava a utilizar o adereço, estampado com exclusividade pelo artista Tico Canato, como acessório de moda, a partir de diversas possibilidades de amarração, do cabelo à roupa.
A concorrida aula, oferecida a cada 15 minutos para grupos de 12 pessoas, em sua maioria mulheres, era conduzida por Roberta Negrini, fundadora do movimento ‘Eu visto o bem’, que atua dentro das penitenciárias femininas. “Nosso objetivo é ampliar as oportunidades das presas para evitar a reincidência na criminalidade”, explicava a idealizadora.
Ao término, além do lenço, os participantes podiam responder a um Quiz e concorrer a outros brindes, como uma tatuagem provisória, ou buscar atendimento individualizado com os especialistas do Sebrae sobre cursos e oportunidades para começar a empreender.
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