Maria de Nazaré Carvalho Nascimento viveu anos sob domínio do marido, com quem morava em Grajaú, cidade no interior do Maranhão. A dona de casa dedicada à criação dos filhos, que sequer podia frequentar a igreja, lamentava-se pela realidade de violência doméstica e dependência financeira. Até que, com a ajuda do avô, conseguiu fazer um curso de costura sem o conhecimento do marido. Ali começaria a reviravolta na história da maranhense, que vive em um novo casamento e, com a ajuda dos filhos, lidera uma loja de paramentos religiosos que comercializa para o Brasil e o mundo.
Às escondidas, Nazaré passou a costurar para os vizinhos, em encomendas para todo tipo de ocasião. Ela usava uma máquina de costura antiga que o marido havia comprado para consertar as roupas da família e dos quatro filhos. As memórias afetivas da infância, quando estudava em escola de freiras, falou mais alto e Nazaré iniciou as tentativas para costurar vestes litúrgicas. As dicas vieram principalmente de um primo padre, que a ensinou a simbologia e a cor de cada peça católica.
Finalmente, em 2001, após 19 anos de casada, Nazaré tomou coragem e se divorciou. Para recomeçar, ela vendeu um sítio do falecido pai por R$ 7 mil, dividiu o dinheiro com a mãe e, com a sua metade e duas máquinas de costura, partiu rumo a São Luís. Lá, ela chegou a racionar alimento para conseguir comprar os primeiros metros de tecido: “Eu comprava 1 metro para montar uma peça, com o dinheiro que recebia comprava mais 1 metro para outra. O lucro que eu tinha eu mandava para as minhas filhas”, revela.
A muito custo, Nazaré conseguiu produzir um conjunto de peças e, de indicação em indicação, teve a oportunidade de expor no salão paroquial da Igreja da Sé. Ali aconteceu a multiplicação dos pães na vida dela: “Quando fiz a exposição, começaram os pedidos. Aí, precisei de mais de uma pessoa para ajudar, depois mais uma, mais outra”. Naquele dia, nasceu então a Paramentos Religiosos Ateliê, que carregava um grande propósito da empreendedora. “Meu sonho era fazer roupa para o Papa”, conta a maranhense.
Foram anos de lutas, desafios e barreiras superadas. Hoje, a empresa produz 1.300 diferentes modelos e tamanho e, o melhor, os religiosos recorrem ao Ateliê para comprar vestes e lembranças quando vão visitar o Papa! “É preciso sonhar um sonho proibido para alcançar a realidade desejada. A pessoa tem que ter muita coragem e foco porque não basta querer empreender. Além de paciência e fé em Deus”, destaca Nazaré, que cumpre a missão de evangelizar com a difusão das vestes litúrgicas.
Os produtos incluem camisas clericais, casulas, túnicas, estolas, vestes para Batismo, Eucaristia e Coroinhas, colarinho romano. Há também conjuntos para altar com alfaias e sobrepeliz, dalmáticas, estolas de aconais, além de camisetas personalizadas e bandeiras dos apostolados. Os preços variam de R$ 25 a R$ 1.700, sendo que alguns modelos chegam a ser bordados com fios de ouro.
Digitalização
Maria de Nazaré procurou o Sebrae para se capacitar e, ano após ano, foi trilhando sua jornada empreendedora. Ela fez cursos ligados à confecção, moda e gestão de empresas, participou de palestras e se graduou em Administração. A grande virada nas vendas veio em 2011, quando, com o suporte do Sebrae, ela criou a loja virtual do Ateliê Paramentos Religiosos. Apoio que Nazaré faz questão de tornar público em suas falas e no próprio site, com “a empresa recebe desde o início a assistência do Sebrae Maranhão”.
Por meio do e-commerce vieram clientes de todo o Brasil e os primeiros pedidos da Itália. As mercadorias são comercializadas na Itália, Estados Unidos, Canadá e Portugal. O sucesso do negócio foi tão grande que Nazaré foi convidada para carregar a tocha olímpica nos jogos Rio 2016. “Às vezes fico pensando como consegui chegar aqui. Antes eu comprava um metro de tecido. Hoje compro dezenas de peças, com 50 metros cada, tudo de uma vez. É por isso que eu digo, nunca é tarde para ser feliz. Tudo na minha vida foi um milagre”, afirma Nazaré, que pretende escrever um livro com a sua história.
Tempos de vacas magras
O momento mais difícil da trajetória empreendedora de Nazaré foi durante a pandemia, em 2020, com os comércios fechados. “Eu tive medo, mas a empresa tinha caixa e decidi não demitir funcionários”, conta, orgulhosa. Da necessidade de fazer a conta fechar, surgiu a ideia de confeccionar máscaras, com entregas feitas a domicílio. “Junto com os funcionários, vencemos aquela luta”. Essa experiência foi a deixa para, na recuperação da pandemia, abrir uma nova frente de negócio, malharia dedicada às festas religiosas.
Não se pode desistir na primeira dificuldade, senão negócio nenhum vai para frente. Todo empreendedor deve ficar atento à situação financeira e a eventualidades.
Na empresa familiar, o esposo de Nazaré fica à frente da malharia, enquanto os quatros filhos se dedicam ao e-commerce, caixa, bordado e designer das peças. Segundo ela, o sucesso caminha lado a lado com o trabalho duro, o compromisso e a humildade: “O segredo é encarar o negócio com seriedade e honestidade, ser pé no chão e estar preparado para novos rumos”.